sábado, 13 de outubro de 2012

Vida-a-vida

E era um corre-corre danado entre uma aula e outra, entre a respiração e a expiração. Que essa rotina é tão doida que entre curtos períodos há de se fazer um mundo inteiro. Precisava almoçar, não comia desde cedo. A opção mais rápida era o tal do McDonald's. Droga! Prometi que não comeria mais naquilo. Foi o jeito. Nem terminei de pagar e minha comida estava lá. Nojo! Sentei para comer e um menino entrou. Vestido numa blusa listrada e uma bermuda um pouco rasgada que parecia bem maior do que deveria ser. Me ofereceu uns panos de pratos. Meu coração apertou, como sempre acontece nessas situações. Um aperto, uma falta de ar, um sentimento de impotência. O que fazer? Mas por que é que não deram um manual para essas situações? Quando me jogaram nesse mundo não me falaram que seria tão ruim sair de casa. Eu havia comprado o almoço no cartão, não tinha absolutamente nada na carteira e nem mais na conta para lhe pagar um lanche. Ele me desejou um bom dia e saiu para a próxima mesa. Antes tivesse praguejado e me amaldiçoado até a última geração, mas ele era educado, mais do que meu irmão caçula. A próxima mesa era de uma família bem vestida e aparentemente educada. Pai, mãe, duas filhas gêmeas que deviam ter uns sete anos. Ora que bonito de se ver! Nunca vi no mundo família tão bem estruturada. Não no meu mundo. O menino falou com o pai que nem o olhou, nem muito menos o deixou terminar o que ia dizer. Apenas balançou a cabeça dizendo "não" olhando para a mesa. A mãe olhava como uma fêmea olha para o macho esperando uma reação que mostre quão dominante ele é. Ela demonstrou sentir um desconforto com a presença do menino e uma certa satisfação pela resposta do marido. O menino saiu. Uma das filhas riu perguntando ao pai o que o menino estava falando. Ele não a olhou, nem a mãe o fez. A deixaram ali alienada a respeito do mundo que a cerca. Amanhã ela pedirá um manual, ou responderá um outro menino na mesma situação sem olhá-lo, como se fosse contagiosa a sua sujeira. Como se ele não fosse digno de respeito. Como se ele tivesse escolhido aquela situação. E assim a vida caminha, de alienados à alienados. Cada um com a sua alienação. Você pode me perguntar qual resposta eu esperava do pai diante a pergunta da filha e se espantar quando eu dizer que seria bom se ele dissesse "Ele pedia por comida". É duro demais para uma criança de sete anos ouvir isso!? Duro é viver num mundo cor de rosa com pôneis dourados, antes aquela menina soubesse desde cedo em que mundo a jogaram. Antes alimentassem nela algum desejo de mudança, algum sentimento de gratidão pela vida que tem. Mas não, é sempre mais cômodo abraçar a ignorância.

Um comentário:

Maieh disse...

Muito bom Ana... como é que sua linha de pensamento escreve o que eu sentia, mas não sabia o como dizer?