sábado, 13 de outubro de 2012

Olhos

O reconheci pelos olhos. Do todo, só pude ver os olhos do menino, porque o reflexo do Sol não me deixava ver o resto. Ele estava com os olhos baixos e, quando olhei, levantou e me olhou bem no fundo dos olhos. Nossos olhares se cruzaram permanecendo estáticos e penetrantes. Na hora eu vi que era a alma dele. Eu senti. Eu reconheci. Minhas pernas tremeram de um jeito que não pude conter minha pouca massa quieta. Tudo vibrava, minha visão ficou escura, meu coração quase saiu pela boca. Respirei, vesti minha máscara e fui até lá, até seus olhos familiares. Ah! Aqueles olhos. Eu gosto deles porque são cheios, porque falam sem descanso. São inquietos e tentam me ler, e conseguem. Sim, eles conseguem. Vencem toda barreira que imponho. Eles esquadrinham o meu coração desvendando todos os segredos que nele há. Somos olhares perdidos buscando uma fuga. Somos olhos que cortam, que ferem a memória, a existência, a pessoa. Não podemos nos olhar e, mesmo assim, olhamos. É uma enorme tentação. Necessito saber o que se passa ali dentro, e o olhar é a porta da alma. Entrei, vasculhei e acabei por achar uma parte de mim. Pedaços, pedaços que não mais se encaixam em mim. Perderam a forma inicial, ganharam uma forma que só se encaixam ali. Não me pertenço mais. Então deixei lá mesmo, intocável. E saí com reverencia, pedindo perdão pela invasão. Invadi aqueles olhos foi como invadi um mundo inteiro. Ele é um emaranhado de pessoas, um pedaço de cada pessoa que encontrou nesses loucos caminhos.

Um comentário:

Maieh disse...

"São inquietos e tentam me ler, e conseguem."
Incrível como vc tem o que escrever, e como escreve. Ótimo!