quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Penso, logo escrevo!

Vejo pernas. Pernas andando, pernas correndo. Compridas, pequenas, grossas, finas. Diferentes ritmos. Vejo cabeças. Voantes, pesadas, vazias, coloridas. É gente. Gente que corre, gente que pára, gente que pensa, gente que trabalha, gente que ama, gente que é amada. Mas tudo passa em uma velocidade que meus olhos não podem acompanhar. Então paro e desvio o olhar. Vejo uma flor, uma somente. Vibrante, intacta e pura como uma virgem. E então ouço. Ouço vozes, são crianças brincando com borboletas. Ouço carros, músicas, conversas, brigas. São sorrisos, lágrimas, beijos ardentes, fome, preguiça, solidão, amores, mentiras, religiões, cores, escuridão. São vidas. Paro em frente uma vidraça e então, no reflexo, só, me vejo. Só então me vejo.

"Penso, logo existo". Mas será que existo mesmo? Será que pode existir um ser tão diferente e por isso tão incompreendido? Acho que venho de outro planeta. Isso! Deve ser... Talvez até de outra galáxia. Uma galáxia onde as pessoas não têm cabeça nem coração. Afinal, não tenho um nem outro. Tenho pensamentos e sentimentos soltos, alheios dentro da minha atmosfera. Minha atmosfera. Hoje tudo fica preso dentro dela, pois sempre que falo ou demonstro as coisas que tenho aqui dentro, é como se estivesse vomitando complexidades em cima das pessoas. Ninguém é capaz de entender um turbilhão, porque é isso que sou. Um turbilhão de sentimentos traduzidos em passos e músicas. As pessoas nunca serão capazes de acompanhar a minha intensidade. Então eu escrevo. E cada palavra que coloco no papel começa a borbulhar como larva de vulcão, liberando a essência, a minha essência. E aí sim o que está dentro de mim sai da minha atmosfera.

Por isso recolho-me nesse lugar onde tudo exala silêncio. Meu mundo paralelo. Onde amar o não entendido deixa perdido esse meu coração e, embora sinta uma enorme necessidade de entender, se assim o for deixarei de ser... um ser. Porque ninguém entende. Quem pode com as discórdias do amor? Quem pode com o crescimento trazido pela dor? Que mistério haveria se todo enigma fosse desvendado?

Enquanto o entendimento não me chega à porta, espero vendo a chuva passar aqui com meu coração a desejar que ela não me cumprimente com um muxoxo. Espero que ela passe sem me olhar e se deixe levar pelo mesmo vento que seria capaz de levar junto minhas incompreensões de mim mesma. Esse devaneio que me vem afagar falsamente a alma é fruto do que passara. Mas o céu estrelado que já vem me tocar é sinal do que virá. Hoje fico surpresa pelo que se constrói por si só. Por essas frases esvoaçantes que pousam em minha mente fundindo indecentemente com a loucura de um ser que nada entende, porém que muito sente.

Hoje me sinto incapaz de colocar em palavras o que estou sentindo. Estou aqui a escrever, riscar e reescrever brigando com as palavras e pontuação tentando dar a forma perfeita ao meu sentimento, desejando pelo menos entender que não entendo o porquê que o poeta só é grande se sofrer. Mas sei que eu, uma pessoa de alma, sou como gota de chuva que se mistura ao mar. Indo e vindo... uma perfeita oscilação, pois o que posso fazer? Sou uma mutação. Nunca estou no mesmo lugar, embora ande tanto em círculos. Nunca sou a mesma, embora tenha uma essência. Não sou mulher fácil de domar. Nessa vida já fui de tudo. Fui mar, fui jangada. Fui voz, fui violão. Fui serva, fui rainha. Hoje tenho um castelo vazio feito de bolhas de sabão, uma coroa de madeira e o inimigo do meu reino é o meu coração. Mas nesse lugar de acasos, de encontros e desencontros, quem sabe esse pobre coração não se torne aliado de meus turbilhões... Não tenho estratégias. Fico buscando idéias, procurando em meu labirinto mental algo que me pudesse ser útil. Mas é uma mutação tão intensa que se assemelha ao vírus HIV, e então nada me serve. E me pergunto aqui com meus turbilhões, o que haveria de ser se não fosse poeta. E a resposta é tão agridoce quanto tudo que tem realmente valor. Se não tivesse a necessidade de ser incompreendida e ver beleza em tudo, a vida seria mais fácil, porém que graça haveria?

Mas o fato é: estou cansada. E estou cansada de estar cansada. Não há sentido em minhas fitas vermelhas, essas mesmas que correm por todo o meu corpo carregando o que leva vida, carregando o que leva morte. Sou só uma mulher – no fundo uma menina, tentando se manter limpa em meio a tanta sujeira, em meio a tantos devaneios de seres humanos ironicamente desumanos. Talvez houvesse mais sentido em me entregar a banalidade. Mas não. Nessa vida já fui Igreja e não me caiu bem a farsa, mas também não quero ser cabaré. Hei de encontrar um equilíbrio para não ser mais um tripulante no barco da hipocrisia. Antes aprenderei a reinar sob o show patético desses parasitas. Embora ache cômica a ironia de serem parasitas deles próprios, não gosto das conseqüências devastadoras trazidas por esse fato. O mundo é a beira do precipício da loucura. Fortes são os equilibristas.

Quem nunca foi jangada? Não há um que já não tenha o sido. Mas quem haverá de ser mar? Mar grande, intenso, eterno? O domínio de um rei acaba, mas a experiência da jangada fica. Não sejamos rei, mas sim reinos nascidos de conquistas verdadeiras e próprias. Ninguém enxerga os pilares até o dia que um cede. Fortes são os que permanecem sem a necessidade de serem vistos. Queria eu poder fazê-los entender que o meu Cristo é diferente. Quando pulei do precipício Ele não me segurou, nem me deixou cair. Ele voou comigo! É algo tão natural, isso é se deixar levar pelo que somos. De todas as confusões, sou a mais intensa. De todos os labirintos, sou o maior. Afinal, sou poetiza. Mas nada disso é relevante quando me dou ao fato de que a Cruz está vazia. Em meio a minha mutação essa é a única certeza que me é fixa.